Vandovsky
Um resto de tudo
Emoções Algarvias IV
Porque será que nós temos
na frente, aos montes, aos molhos,
tantas coisas que não vemos
nem mesmo perto dos olhos?
Gosto do preto no branco,
como costumam dizer:
antes perder por ser franco
que ganhar por não ser.
Entre leigos ou letrados,
fala só de vez em quando,
que nós, às vezes, calados,
dizemos mais que falando.
Quando te vês mal, e dizes
que preferias a morte,
pensa que outros menos felizes
invejam a tua sorte.
Quando os homens se convençam
que a força nada faz,
serão felizes os que pensam
num mundo de amor e paz.
(Quadras Soltas)
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Emoções Algarvias III
Julgando um dever cumprir,
Sem descer no meu critério,
- Digo verdades a rir
Aos que me mentem a sério!
Que importa perder a vida
na luta contra a traição
se a razão mesmo vencida
não deixa de ser razão
A arte em nós se revela
Sempre de forma diferente:
Cai no papel ou na tela
Conforme o artista sente
Quem prende a água que corre
É por si próprio enganado;
O ribeirinho não morre,
Vai correr por outro lado.
Quando os Homens se convençam
Que à força nada se faz,
Serão f’lizes os que pensam
Num mundo de amor e paz.
(Quadras Soltas)
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Emoções Algarvias II
Embora os meus olhos sejam
os mais pequenos do Mundo,
o que importa é que eles vejam
o que os homens são no fundo.
Uma mosca sem valor
poisa c’o a mesma alegria
na careca de um doutor
como em qualquer porcaria.
Não sou esperto nem bruto
nem bem nem mal educado:
sou simplesmente o produto
do meio em que fui criado.
Queremos ver sempre à distância
o que não está descoberto,
Sem ligarmos importância
ao que está à vista e perto.
Ser artista é ser alguém!
Que bonito é ser artista...
Ver as coisas mais além
do que alcança a nossa vista!
(Quadras Soltas)
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Emoções Algarvias
Forçam-me, mesmo velhote,
de vez em quando, a beijar
a mão que brande o chicote
que tanto me faz penar.
Porque o mundo me empurrou,
caí na lama, e então
tomei-lhe a cor, mas não sou
a lama que muitos são.
A vida na grande terra
corrompe a humanidade.
Entre a cidade e a serra
prefiro a serra à cidade.
O mundo só pode ser
melhor do que até aqui,
- quando consigas fazer
mais p'los outros que por ti!
Para não fazeres ofensas
e teres dias felizes,
não digas tudo o que pensas,
mas pensa tudo o que dizes.
(Quadras Soltas)
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Lisboa e ... emoções
No Castelo ponho um cotovelo
Em Alfama descanso o olhar
E assim desfaço o novelo
De azul e mar
À Ribeira encosto a cabeça
Almofada da cama do Tejo
Com lençóis bordados à pressa
Na cambraia de um beijo
Lisboa menina e moça, menina
Da luz que os meus olhos vêem, tão pura
Teus seios são as colinas, varina
Pregão que me traz à porta, ternura
Cidade a ponto luz bordada
Toalha à beira mar estendida
Lisboa menina e moça, amada
Cidade mulher da minha vida
No Terreiro eu passo por ti
Mas na Graça, eu vejo-te nua
Quando um pombo te olha sorri
És mulher da rua
E no bairro mais alto do sonho
Ponho o fado que soube inventar
Aguardente de vida e medronho
Que me faz cantar
Lisboa menina e moça, menina
Da luz que os meus olhos vêem, tão pura
Teus seios são as colinas, varina
Pregão que me traz à porta, ternura
Cidade a ponto luz bordada
Toalha à beira mar estendida
Lisboa menina e moça, amada
Cidade mulher da minha vida
Lisboa do meu amor, deitada
Cidade por minhas mãos despida
Lisboa menina e moça, amada
Cidade mulher da minha vida
Ary dos Santos
Lisboa com suas casas
De várias cores,
Lisboa com suas casas
De várias cores,
Lisboa com suas casas
De várias cores...
À força de diferente, isto é monótono.
Como à força de sentir, fico só a pensar.
Se, de noite, deitado mas desperto,
Na lucidez inútil de não poder dormir,
Quero imaginar qualquer coisa
E surge sempre outra (porque há sono,
E, porque há sono, um bocado de sonho),
Quero alongar a vista com que imagino
Por grandes palmares fantásticos,
Mas não vejo mais,
Contra uma espécie de lado de dentro de pálpebras,
Que Lisboa com suas casas
De várias cores.
Sorrio, porque, aqui, deitado, é outra coisa.
A força de monótono, é diferente.
E, à força de ser eu, durmo e esqueço que existo.
Fica só, sem mim, que esqueci porque durmo,
Lisboa com suas casas
De várias cores.
Álvaro de Campos, in "Poemas"
Heterónimo de Fernando Pessoa
Balada de Lisboa
Em cada esquina te vais
Em cada esquina te vejo
Esta é a cidade que tem
Teu nome escrito no cais
A cidade onde desenho
Teu rosto com sol e Tejo
Caravelas te levaram
Caravelas te perderam
Esta é a cidade onde chegas
Nas manhãs de tua ausência
Tão perto de mim tão longe
Tão fora de seres presente
Esta e a cidade onde estás
Como quem não volta mais
Tão dentro de mim tão que
Nunca ninguém por ninguém
Em cada dia regressas
Em cada dia te vais
Em cada rua me foges
Em cada rua te vejo
Tão doente da viagem
Teu rosto de sol e Tejo
Esta é a cidade onde moras
Como quem está de passagem
Às vezes pergunto se
Às vezes pergunto quem
Esta é a cidade onde estás
Com quem nunca mais vem
Tão longe de mim tão perto
Ninguém assim por ninguém
Manuel Alegre, in "Babilónia"
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Porto e ... costumes
A Vendedeira do Porto O Aguadeiro
Dobrada à Moda do Porto
Um dia, num restaurante, fora do espaço e do tempo,
Serviram-me o amor como dobrada fria.
Disse delicadamente ao missionário da cozinha
Que a preferia quente,
Que a dobrada (e era à moda do Porto) nunca se come fria.
Impacientaram-se comigo.
Nunca se pode ter razão, nem num restaurante.
Não comi, não pedi outra coisa, paguei a conta,
E vim passear para toda a rua.
Quem sabe o que isto quer dizer?
Eu não sei, e foi comigo ...
(Sei muito bem que na infância de toda a gente houve um jardim,
Particular ou público, ou do vizinho.
Sei muito bem que brincarmos era o dono dele.
E que a tristeza é de hoje).
Sei isso muitas vezes,
Mas, se eu pedi amor, porque é que me trouxeram
Dobrada à moda do Porto fria?
Não é prato que se possa comer frio,
Mas trouxeram-mo frio.
Não me queixei, mas estava frio,
Nunca se pode comer frio, mas veio frio.
Álvaro de Campos, in "Poemas"
Heterónimo de Fernando Pessoa
Banheira Foz do Douro Padeira
"ImPORTO-me"
ImPORTO-me contigo porque te amo
E não quero ver-te em vil servidão
Sendo mote para escárnio ou maldição
ImPORTO-me contigo
Porque és cinza e verde e invicta
E granítica e nobre e leal
E constróis e exportas o nome de Portugal.
ImPORTO-me porque és Porto
És povo, és berço, és cidade
És palavra, honra e dignidade
És mar revolto e Douro adormecido
És nevoeiro cerrado és neblina doce
És trabalho e luta contra o Poder
És antes quebrar que torcer
És a coragem do Norte
A brisa de Verão e o vento inclemente e forte
És mágoa e a dor bendigo
Mas não serás nunca bobo bajulador ou mendigo
ImPORTO-me contigo
E morro amando-te Meu Porto”
Maria de Lurdes dos Anjos (Professora)
“Nobre Povo Tripeira Gente”
Gailivro
Polícia Civil Vareira
Dicionário Tripeiro
A canalha - Crianças, catraios
À hora do meio-dia - à hora do almoço
À Meia-hora - Ao meio-dia e meia hora
À minha beira - Ao pé de mim
Aguça - Apara-lápis
Aleijar - Magoar
Alguidar - Recipiente de barro para o arroz de forno
Aloquete - Cadeado
Apanhador - Pá do lixo
Apetitoso - Salgado
Assadeira - Pingadeira
Assapateirado – Mal feito, acabado à pressa
Azeiteiro - Bimbo
Bacia - Alguidar
Bagem – Feijão verde
Baronas ou priscas - Beatas
Bijú, moléte - Papo-seco
Bolacha maria - Gaja gorda com cara redonda
Borracha - Elástico
Bouça - Terra com mato
Breca - Cãibra
Broche - Pregadeira
Bueiro - Sargeta
Bufar - Soprar
c*g*-tacos - Pessoa baixinha
Calcadela – Pisadela
Calcar - Pisar
Caleira - Algeroz
Cameleira – Japoneira
Carapins - Botinhas de lã para bebé
Carteira – Mala
Catotas – Macacos do nariz
Chibar - Denunciar, fazer queixa
Chuço, guarda-chuva - Chapéu de chuva
Ciclistas – Feijões-frade
Cimbalino ou café - Bica
Coador - Passador
Conduto - Prato principal
Cordões - Atacadores
Coturnos - Peúgas
Cruzeta - Cabide
Damasco - Alperce
Dar aos calcantes - Dar à sola
Embufado - Amuado, ressentido
Entalar-se - Engasgar-se
Ervas - Esparregado
Esbotenado - Lascado
Espilrar - Espirrar
Espinhas - Borbulhas
Estrugido - Refogado
Fatia de rolo - Fatia de torta
Fazer o comer - Cozinhar
Ferrar - Morder
Finguelinhas - Pessoa magrinha
Fino - Imperial
Fiúza - Pessoa esperta
Foguete na perna - Malha nos collants
Guarda-sol – Chapéu de sol
Iscas - Pataniscas
Jeco - Cão
Lapada - Sova, tareia
LaBagice - Mistela, mistura de comidas
Limpar os salões - Tirar macacos do nariz
Lôstra - Chapada na cara
Magnório - Nêspera
Malga - Taça
Mirolha - Vesgo/a, Estrábico/a
Môina - Polícia
Murcão - Estúpido, de raciocínio lento, pasmado
Ourado - Enjoado, tonto
Ouras - Tontura, vertigem
Pascácio - Tolo
Penca - Couve portuguesa
Picheleiro - Canalizador
Pinchar - Saltar, pular
Pingo - Garoto
Pisaduras- Nódoas negras
Porrão - Pote de barro
Porta moedas – Carteira
Pote - Penico
Prato sopeiro e ladeiro - Prato de sopa e prato liso
Quarto de banho - Casa de banho
Rêpas - Franja
Ruço - Loiro
Saca – Saco de plástico
Salgalhada – Confusão, trapalhada
Sameira - Carica
Sapatilhas - Ténis
SaraiBa - Granizo
SaraiBar - Cair granizo
Sertã - Frigideira
Sôstra, sostrôna - Preguiçosa, desmazelada
Sostrice - Preguiça, moleza
Tacão – Salto alto
Testo - Tampa de panela
Tijelinha - Pastel de nata
Touço - Pacóvio, labrego
Toutiço - Cabeça
Trengo/a - Desajeitado, inábil, tosco
Trilhar - Entalar
Tripas - Dobrada
Trolha - Trabalhador da construção civil (engate de trolha, bronzeado à trolha…)
Tropas ou mangalas - Feijão Verde
Volta de ouro - Fio de ouro
A Cadeirinha do Porto Ferro Velho
Azeiteiro Saloia
Porto Sentido
Quem vem e atravessa o rio
Junto à serra do Pilar
vê um velho casario
que se estende ate ao mar
Quem te vê ao vir da ponte
és cascata, são-joanina
erigida sobre um monte
no meio da neblina.
Por ruelas e calçadas
da Ribeira até à Foz
por pedras sujas e gastas
e lampiões tristes e sós.
E esse teu ar grave e sério
dum rosto de cantaria
que nos oculta o mistério
dessa luz bela e sombria
Ver-te assim abandonado
nesse timbre pardacento
nesse teu jeito fechado
de quem mói um sentimento
E é sempre a primeira vez
em cada regresso a casa
rever-te nessa altivez
de milhafre ferido na asa
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Amor / Amizade...
Perguntei a um sábio,
a diferença que havia
entre amor e amizade,
ele me disse essa verdade...
O Amor é mais sensível,
a Amizade mais segura.
O Amor nos dá asas,
a Amizade o chão.
No Amor há mais carinho,
na Amizade compreensão.
O Amor é plantado
e com carinho cultivado,
a Amizade vem faceira,
e com troca de alegria e tristeza,
torna-se uma grande e querida
companheira.
Mas quando o Amor é sincero
ele vem com um grande amigo,
e quando a Amizade é concreta,
ela é cheia de amor e carinho.
Quando se tem um amigo
ou uma grande paixão,
ambos sentimentos coexistem
dentro do seu coração.
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Tudo o que faço ou medito
Tudo o que faço ou medito
Fica sempre na metade.
Querendo, quero o infinito.
Fazendo, nada é verdade.
Que nojo de mim fica
Ao olhar para o que faço!
Minha alma é lúcida e rica
E eu sou um mar de sargaço –
Um mar onde bóiam lentos
Fragmentos de um mar de além...
Vontades ou pensamentos?
Não o sei e sei-o bem.
Fernando Pessoa
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Viver...
O Homem não é mais do que o seu próprio projecto e só existe na medida em que o realiza!!
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Provérbio Árabe
"Aquele que sabe e sabe que sabe
é sábio -segue-o
Aquele que sabe e não sabe que sabe
está a dormir - acorda-o
Aquele que não sabe e não sabe que não sabe
é um idiota - enxota-o
Aquele que não sabe e sabe que não sabe
é simples - ensina-o"