Vandovsky
Um resto de tudo
Winter Wonder
A pálida luz da manhã de Inverno,
O cais e a razão
Não dão mais esperança, nem uma esperança sequer,
Ao meu coração.
O que tem que ser
Será, quer eu queira que seja ou que não.
No rumor do cais, no bulício do rio
Na rua a acordar
Não há mais sossego, nem um vazio sequer,
Para o meu esperar.
O que tem que não ser
Algures será, se o pensei; tudo mais é sonhar.
Fernando Pessoa
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Poema de Natal
Para isso fomos feitos:
Para lembrar e ser lembrados
Para chorar e fazer chorar
Para enterrar os nossos mortos —
Por isso temos braços longos para os adeuses
Mãos para colher o que foi dado
Dedos para cavar a terra.
Assim será nossa vida:
Uma tarde sempre a esquecer
Uma estrela a se apagar na treva
Um caminho entre dois túmulos —
Por isso precisamos velar
Falar baixo, pisar leve, ver
A noite dormir em silêncio.
Não há muito o que dizer:
Uma canção sobre um berço
Um verso, talvez de amor
Uma prece por quem se vai —
Mas que essa hora não esqueça
E por ela os nossos corações
Se deixem, graves e simples.
Pois para isso fomos feitos:
Para a esperança no milagre
Para a participação da poesia
Para ver a face da morte —
De repente nunca mais esperaremos...
Hoje a noite é jovem; da morte, apenas
Nascemos, imensamente.
Vinicius de Moraes
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Os sapatos na chaminé
Quando, na noite de 24 de Dezembro de 286, os irmãos Crispim e Crispiniano fugiam às perseguições, em Crepy-Valois, fartaram-se de bater às portas das casa, mas ninguém lhes deu abrigo.
Acolheu-os, numa cabana escondida num bosque, quase a desmoronar-se, uma viúva que vivia miseravelmente com o filho. Deu-lhes uma tigela de caldo de couves e dois nacos de pão negro.
Contentes, os dois irmãos, que eram soqueiros, pediram a Deus que recompensasse a generosidade da viúva.

Crispim viu a um canto um par de socos velhos, do rapazinho, fez um par deles novos e colocou-os à beira da pedra da lareira, enquanto a viúva e o filho dormiam. Quando eles acordaram repararam que os dois hóspedes tinham desaparecido e na lareira estava um par de socos novos, transbordante de moedas de ouro.
Desde o séc. III, segundo a lenda, todas as crianças põem os socos na lareira, na esperança de que se repita o milagre feito por intermédio dos santos padroeiros dos sapateiros São Crispim e S. Crispiniano.